8 de janeiro
Anistia seria preocupante e mau exemplo, dizem juristas
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23 horas agoon
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Redação

Convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores, uma manifestação marcada para este domingo (16), no Rio de Janeiro, defenderá a anistia aos réus processados por atos antidemocráticos em Brasília, em 8 de janeiro de 2023. O protesto busca impulsionar a tramitação de projetos de lei no Congresso Nacional que propõem a extinção da punição aos envolvidos nas invasões e depredações às sedes dos três poderes há dois anos.
Juristas ouvidos pela Agência Brasil consideram que anistiar crimes contra a democracia é preocupante. Para Gustavo Sampaio, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF), a anistia seria um mau exemplo para o país.
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“Com democracia não se brinca. Se houve crimes contra a democracia, e todas as provas demonstram cabalmente que esses crimes aconteceram, não é razoável a esses criminosos que lhes seja dado o perdão da anistia. Isso será o mesmo que conceder um mau exemplo ao Brasil, um mau exemplo a essas pessoas de que poderão se articular novamente contra o Estado Democrático de Direito, acreditando que receberão o perdão”.
Além disso, de acordo com o professor a proposta de anistia não vem em um bom momento. “Essas pessoas, que são autoras de crimes contra o Estado Democrático de Direito, precisam receber severas sanções para que assim fique o bom exemplo e que ninguém se articule novamente para obrar contra a democracia brasileira”, explica o professor.
Segundo ele, a democracia “é valor maior, é cláusula pétrea do sistema constitucional, é princípio da ordem institucional do Estado brasileiro e com isso não se pode, evidentemente, transigir. É um valor que devemos defender, de maneira que o projeto de lei de anistia não vem num bom momento e não dá um bom sinal político para a democracia brasileira”.
A professora de Direito Penal da Fundação Getulio Vargas em São Paulo (FGV) Raquel Scalcon afirma que é difícil sustentar a legitimidade de uma anistia a pessoas que atentaram contra o Estado Democrático de Direito.
“No fundo, estamos falando de crimes que querem, pelo menos em tese, implodir o próprio sistema democrático, o sistema constitucional. Eu não acho que nunca nada possa ser anistiado, só me preocupa o fato de que nós estamos tratando de discussões que envolvem crimes contra o Estado Democrático de Direito”.
Golpe na democracia
Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Vitor Schirato, a anistia representaria um golpe na democracia brasileira. “É um enfraquecimento enorme da democracia brasileira. É mais uma fragilização na democracia brasileira, sem dúvida nenhuma”, destaca.
Segundo ele, “é absolutamente despropositado imaginar um parlamentar democraticamente eleito, que exerce a sua função por causa do Estado Democrático de Direito, possa anistiar quem tentou acabar com o Estado Democrático de Direito”.
Em nota divulgada em fevereiro deste ano, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) afirmou que “a anistia aos golpistas é um desrespeito à memória de todos aqueles que lutaram pela democracia em nosso país e foram mortos. É fundamental que todos se unam, exigindo que nossos representantes ajam com responsabilidade na proteção dos valores democráticos”, diz a nota. “Não admitiremos anistia! Nosso país precisa caminhar com Memória, Verdade e, sobretudo, Justiça!”.




O 8 de janeiro
Uma semana após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 1º de janeiro de 2023, manifestantes que estavam acampados em frente ao Quartel General do Exército Brasileiro, em Brasília, se reuniram com militantes de outros locais na Esplanada dos Ministérios e avançaram, sem ser impedidos pela Polícia Militar do Distrito Federal, contra os prédios da Praça dos Três Poderes, invadindo as sedes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.
Criminosos promoveram atos de vandalismo que destruíram mobiliário, obras de arte e objetos históricos, além de gabinetes, vidraças, equipamentos eletrônicos e outros bens que encontraram pelo caminho.
A destruição foi transmitida ao vivo pela imprensa e causou choque e indignação em autoridades e na sociedade civil. Mais de 1,4 mil pessoas foram presas, e o Ministério Público Federal ofereceu denúncias contra 1,7 mil envolvidos nos ataques.
Até dezembro de 2024, 370 pessoas já haviam sido condenadas pelos crimes relacionados ao ataque, entre eles golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e dano qualificado. Além disso, mais de 500 pessoas haviam assinado acordos na Justiça. No último dia 7, mais 63 pessoas foram condenadas a penas que chegam a 14 anos de prisão
A Polícia Federal e a Procuradoria Geral da República afirmam que o atentado fez parte de uma tentativa de golpe de Estado articulada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados, que foram indiciados e denunciados à Justiça.
Segundo o relatório da PF e a denúncia da PGR, o episódio se insere em uma cronologia que incluiu a deslegitimação das urnas eletrônicas, os acampamentos em frente a quartéis para mobilizar as Forças Armadas, ataques nas redes sociais a comandantes que não apoiassem o golpe e até mesmo planos para assassinar o presidente da república, o vice e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Quando a denúncia foi revelada, o advogado de defesa de Jair Bolsonaro, Paulo Cunha Bueno, divulgou nota na qual afirma que o ex-presidente “jamais compactuou com qualquer movimento que visasse a desconstrução do Estado Democrático de Direito ou as instituições que o pavimentam”. Segundo ele, nenhum elemento que conectasse minimamente o presidente à narrativa construída na denúncia foi encontrado. “Não há qualquer mensagem do então presidente da República que embase a acusação”.
Projetos de lei
Os projetos de anistia que tramitam na Câmara dos Deputados foram unidos ao Projeto de lei 2.858/2022, de autoria de major Vitor Hugo (PL-GO), que anistia os processados por crimes relacionados a manifestações contra o resultado da eleição presidencial de 2022, ocorridas a partir do segundo turno do pleito, em 30 de outubro daquele ano, o que inclui os atos de 8 de janeiro do ano seguinte.
No Senado Federal, tramitam outros projetos, como o PL 5.064/2023, de autoria de Hamilton Mourão (Republicanos/RS), que anistia os envolvidos nos atos de 8 de janeiro das condenações pelos crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Outro, de autoria de Márcio Bittar (União/AC), além de anistiar todos os crimes, restaura os direitos políticos de cidadãos declarados inelegíveis por atos relacionados às eleições de 2022.
Os defensores da anistia alegam que há perseguição política aos réus e denunciados por golpe de Estado. Autor do projeto de lei que tramita na Câmara, o ex-deputado federal e hoje vereador em Goiânia, major Vitor Hugo escreveu em suas redes sociais, na semana passada, que “cidadãos honestos” estão sendo tratados como “inimigos da democracia só porque pensam diferente”.
O senador Márcio Bittar divulgou em suas redes sociais também na semana passada, vídeo em que diz que “brasileiros condenados injustamente precisam da nossa ajuda”.
Já o senador Hamilton Mourão afirmou que seu projeto de lei de anistia foi pensado para “barrar a injustiça decorrente das condenações desproporcionais de homens e mulheres detidos em decorrência dos atos de 8 de janeiro” e que a anistia não representa impunidade, mas a luta contra penalidades desproporcionais aplicadas”.




Constitucionalidade
Os juristas ouvidos pela Agência Brasil explicaram que a Constituição Federal dá poder ao Congresso Nacional de conceder anistia a pessoas condenadas no Brasil. No entanto, há controvérsias, no meio jurídico, sobre se seria possível anistiar pessoas envolvidas em crimes contra o Estado Democrático de Direito.
“A anistia se caracteriza como um perdão concedido pelo legislador, que é diferente do perdão concedido pelo Poder Executivo no indulto. O perdão concedido pelo legislador é muito mais amplo, é concedido por lei e extingue o crime, porque quem tem autoridade para legislar é o Congresso Nacional”, explica Gustavo Sampaio.
Segundo ele, no entanto, o poder de anistiar crimes não é ilimitado. Há, segundo Sampaio, uma divisão de entendimento no meio jurídico em relação à anistia a crimes contra a democracia.
Entre os que defendem a possibilidade de anistia, a justificativa é que a Constituição Federal diz apenas que a ação de grupo armado contra a ordem constitucional e o Estado Democrático é “crime inafiançável e imprescritível”, mas não define, de forma explícita, que seja insuscetível a anistia.
Entre aqueles que consideram a impossibilidade da anistia estão juristas que consideram que a Constituição impõe uma “limitação implícita” e que anistiar um crime contra a democracia é incoerente.
“O Congresso Nacional, a quem é dado o poder de conceder a anistia, é a casa de representação do povo. Ele é eleito pelo povo. Eleito pelo povo porque temos uma democracia em que o povo pode eleger os seus representantes. Então, essa parte da doutrina diz que seria contraditório que o Congresso Nacional pudesse conceder a anistia aos detratores da democracia, se o próprio Congresso Nacional existe em razão da democracia”.
Segundo Raquel Scalcon, anistia é a extinção de punibilidade de um crime. “O Estado deixa de ter o poder de punir alguém por um fato criminoso, ou seja, de punir um grupo mais ou menos identificável de pessoas. A Constituição dá o poder de criar uma lei de anistia para o Poder Legislativo. E tirando alguns crimes que a própria Constituição fala expressamente que não podem sofrer anistia, a Constituição não traz grandes critérios sobre o que pode ser abarcado por uma anistia”.




STF
A jurista explica que, caso os projetos de lei sejam aprovados pelo Congresso Nacional, seguramente serão submetidos à apreciação do Supremo Tribunal Federal (STF).
“Acho impossível que não haja, como ato subsequente, uma nova queda de braço no âmbito do Supremo, alegando-se [por pessoas contrárias à anistia] que há uma inconstitucionalidade ali. Será que esses crimes são efetivamente passíveis de anistia? Acho que essa seria uma pergunta central que o Supremo teria que responder”.
Ela acredita que, no caso de a anistia chegar ao STF, a corte tenderia a considerar que certos crimes não podem ser anistiados, especialmente se tratando de crimes contra o Estado Democrático. “A jurisprudência tem sido cada vez mais exigente, diminuindo a discricionaridade dos poderes de anistiar ou de indultar. Acho que a tendência seria o Supremo entender como inconstitucional”.
Gustavo Sampaio também acredita que a questão será certamente definida pelo STF. “Como tem acontecido com muitas leis no Brasil, decerto que, se o Congresso aprovar um projeto de lei nesse sentido, essa futura lei será levada ao Supremo Tribunal Federal, que examinará se o Congresso Nacional teria ou não poder para conceder aquele benefício de anistia”.
Em maio de 2023, o STF anulou, por oito votos a dois, um indulto concedido, em 2022, ao ex-deputado Daniel Silveira, pelo então presidente da República, Jair Bolsonaro, seu aliado, por considerá-lo inconstitucional.
Em seu voto, o ministro do Supremo Dias Toffoli considerou que atos atentatórios à democracia não poderiam ser objeto de indulto [extinção de punibilidade concedida pelo Poder Executivo, em vez do Legislativo].
Toffoli considerou que os crimes cometidos por Silveira, condenado pela Corte a oito anos e nove meses por ameaça ao Estado Democrático de Direito e coação no curso do processo, foram um embrião dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
Já a ministra Carmen Lúcia ressaltou que o indulto não poderia ser instrumento de impunidade nem uma mensagem para que as pessoas possam continuar a praticar crimes contra a democracia.
“Nenhuma capacidade jurídica é ilimitada. Não existe nada que seja ilimitado. É óbvio que o Congresso Nacional tem a competência de conceder anistia, mas é uma competência limitada. O Congresso não pode conceder anistia em qualquer caso, do jeito que ele queira. Não é coerente utilizar um mecanismo do Estado Democrático de Direito para perdoar quem atentou contra o Estado Democrático de Direito”, afirma Schirato.




Aplicação
Os dois juristas ouvidos pela Agência Brasil consideram que, se a anistia for concedida pelo Congresso, ela beneficiará não apenas aqueles que participaram ativamente dos atos de 8 de janeiro, como aqueles que foram denunciados como organizadores de uma tentativa de golpe de Estado no país, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Gustavo Sampaio destaca, no entanto, que será preciso discutir, por exemplo, se uma lei de anistia poderá ser aplicada a pessoas que ainda não tiveram sentença condenatória, como é o caso de Bolsonaro e dos denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR), em fevereiro deste ano.
“A ação penal em relação aos invasores da Praça dos Três Poderes já existe, e muitos já foram até condenados. Mas, em relação à estrutura hierárquica superior do governo, a ação penal vai haver agora, se for recebida a denúncia e instaurada a ação na primeira turma do Supremo Tribunal Federal. Ora, se nem há ação penal, não há condenação, se não há condenação, não há crime. Como é que o Congresso já pode anistiar?”, argumenta o jurista.
Raquel Scalcon afirma que, caso a anistia seja aprovada no Congresso, além do julgamento em relação à inconstitucionalidade da lei, o STF ainda terá que definir se a anistia se aplica a cada ação específica.
“É preciso analisar, caso a caso, porque a lei não vai ser específica para fulano. Ela será uma lei geral. Quem analisa se aquele caso está abarcado ou não pela lei de anistia é o próprio Poder Judiciário. É o Judiciário que vai declarar extinta a punibilidade. Não tem como o Congresso Nacional parar todos os processos que envolvem esse tema. Essa análise precisará ser feita pelo Judiciário”, explica a jurista.
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Redação

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União/AP), defendeu que o projeto de lei que prevê a anistia aos condenados por tentativa de golpe de Estado, em tramitação na Câmara dos Deputados, não é um assunto dos brasileiros.
“Isso não é um assunto que nós estamos debatendo. Quando a gente fala desse assunto em todo instante, a gente está dando, de novo, a oportunidade de nós ficarmos, na nossa sociedade, dividindo um assunto que não é um assunto dos brasileiros”, afirmou Alcolumbre.
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Para o senador, a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR) por tentativa de golpe de Estado contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras 33 pessoas deve ser estritamente jurídico, sem contaminar o ambiente político do parlamento.
“Ter a compreensão e a confiança que no Judiciário isso se tratará dentro dos parâmetros estabelecidos pela legislação brasileira e pelas leis, com imparcialidade, com cautela. Não é adequado transformar isso em procedimento político”, completou.
Após a denúncia da PGR, os aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro no Congresso Nacional intensificaram a articulação para pautar o projeto de lei da Anistia aos envolvidos no 8 de janeiro de 2023, quando apoiadores de Bolsonaro depredaram as sedes dos poderes, em Brasília, exigindo um golpe militar no Brasil.
A denúncia da PGR afirma que houve uma trama golpista liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para permanecer no poder mesmo após a derrota nas urnas em 2022, incluindo planos para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice, Geraldo Alckmin, e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Os envolvidos negam as acusações e defendem que há perseguição política. Em nota, a defesa do ex-presidente informou ter ficado “estarrecida e indignada com a denúncia”. A nota afirma que Bolsonaro “jamais compactuou com qualquer movimento que visasse a desconstrução do Estado Democrático de Direito ou as instituições que o pavimentam”, disse o advogado Paulo Cunha Bueno.
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Conheça a cronologia da tentativa de golpe de Estado, segundo a PGR
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Março de 2021 pode ser considerado um mês chave para que fosse colocado em marcha um plano de ruptura da ordem democrática e de concretização de um golpe de Estado, por Jair Bolsonaro e seus aliados, segundo denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). No dia 8 daquele mês, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Facchin anulou as condenações de Luiz Inácio Lula da Silva, relacionadas à Operação Lava Jato, e tornou-o elegível novamente.
Lula vinha sendo apontado como principal adversário do então presidente Jair Bolsonaro na eleição presidencial do ano seguinte e pesquisas eleitorais mostravam o petista à frente.
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A situação política mobilizou o entorno de Bolsonaro, que percebeu “a necessidade de pronta arregimentação de ações coordenadas contra a possibilidade temida que se avultava. Começaram, então, práticas de execução do plano articulado para a manutenção do poder do Presidente da República não obstante o resultado que as urnas oferecessem no ano seguinte”, diz o procurador-geral da República, Paulo Gonet, na denúncia apresentada à Justiça.
Ainda em março, poucos dias depois de Lula ter recuperado sua elegibilidade, o grupo de apoio a Bolsonaro, que viria a se tornar o núcleo da organização criminosa acusada de crimes contra as instituições democráticas pela PGR, passou a cogitar de o então presidente da República passar a afrontar e a desobedecer decisões do STF.
Nas semanas seguintes, o grupo passaria a defender a ideia de deslegitimar o processo eleitoral brasileiro e a possível vitória do adversário de Bolsonaro.
“O grupo registrou a ideia de ‘estabelecer um discurso sobre urnas eletrônicas e votações’ e de replicar essa narrativa ‘novamente e constantemente’, a fim de deslegitimar possível resultado eleitoral que lhe fosse desfavorável e propiciar condições indutoras da deposição do governo eleito”, destaca a denúncia.
Críticas às urnas
O plano de insurreição demorou cerca de três meses para ser colocado em prática. No dia 29 de julho daquele ano, Jair Bolsonaro fez uma transmissão ao vivo, pela internet, das dependências do Palácio do Planalto, em que criticava o sistema eletrônico de votação e exaltava a atuação das Forças Armadas.
A partir desse momento, segundo a PGR, Bolsonaro passaria a fazer pronunciamentos públicos cada vez mais agressivos, com ataques diretos aos poderes constituídos, com o objetivo de causar indignação e revolta em seus apoiadores. O objetivo final, segundo a denúncia, seria tornar aceitável e esperável o recurso à força caso Lula vencesse as eleições de 2022.
Mesmo com a decisão da Câmara dos Deputados, de manter as sistemáticas de votação digital e de apuração dos votos, em sessão no dia 10 de agosto, Bolsonaro insistiu nos ataques ao sistema eleitoral.
Durante os festejos de 7 de Setembro de 2021, Bolsonaro fez um discurso, em São Paulo, no qual “deu a conhecer seu propósito de não mais se submeter às deliberações provenientes da Suprema Corte, confiado no apoio que teria das Forças Armadas”. A essa altura, segundo a PGR, o grupo ao redor do então presidente já tinha traçado uma estratégia que incluía um plano de fuga de Bolsonaro, caso lhe faltasse apoio para o golpe de Estado.
“[Quero] dizer àqueles que querem me tornar inelegível em Brasília: só Deus me tira de lá. E aqueles que pensam que, com uma caneta, podem me tirar da presidência, digo uma coisa, para todos nós. Temos três alternativas, em especial para mim: preso, morto ou com vitória. [Quero] dizer aos canalhas que eu nunca serei preso”, disse Bolsonaro em seu discurso, na ocasião.
Com o passar dos meses e com a aproximação das eleições de 2022, os ataques ao sistema eleitoral foram intensificados, com acusações falsas e manipuladas sobre supostas vulnerabilidades das urnas eletrônicas a fraudes. Todos os ataques à legitimidade foram sempre respondidos oficialmente, por autoridades judiciais, com argumentos técnicos, mas isso continuou sendo ignorado pelo grupo.
Reuniões
Em 5 julho de 2022, com Lula como favorito à disputa presidencial, Bolsonaro teria convocado uma reunião ministerial para incitar ataques às urnas e a difusão de notícias falsas contra seu adversário. No encontro com os ministros, segundo a denúncia do Ministério Público, “falou-se inequivocamente em ‘uso da força’ como alternativa a ser implementada, se necessário”.
General Augusto Heleno, um dos acusados de integrar o núcleo golpista, chegou a dizer na reunião que, o que tivesse que ser feito, teria que acontecer antes da eleição. “Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições”.
No dia 18 daquele mês, o então presidente da República convocou embaixadores e representantes diplomáticos de outros países para uma reunião em que fez acusações sobre as supostas fraudes que, segundo Bolsonaro, seriam cometidas nas eleições daquele ano.
Ações
Além de divulgar falsas informações sobre o sistema eleitoral, segundo a PGR, o grupo tentou intervir diretamente no processo eleitoral, já que, durante o segundo turno da eleição, em 31 de outubro, policiais rodoviários federais fizeram operações em estradas para dificultar o acesso de eleitores a zonas eleitorais onde Lula obtivera mais votos no primeiro turno.
Os locais de operação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) foram definidos previamente, a partir de mapeamentos feitos por órgãos de segurança vinculados Ministério da Justiça e mobilizados de forma ilícita para a tarefa, de acordo com a PGR.
Com a vitória de Lula, as críticas ao sistema eleitoral persistiram, mesmo depois de relatório de fiscalização das urnas, feito pelo Ministério da Defesa, assegurar que nenhuma falha foi encontrada no sistema de urnas eletrônicas.
A ideia de manter as críticas ao sistema eleitoral depois da derrota de Bolsonaro tinha o propósito de estimular a militância do então presidente da República, cujo mandato se encerraria em 31 de dezembro, a se manter acampada, em frente aos quartéis, pedindo intervenção militar contra a posse do candidato adversário vitorioso.
O núcleo golpista pretendia que a mobilização da militância sensibilizasse as Forças Armadas, em especial, o Exército, para que impusessem um regime de exceção, impedissem a posse de Lula e garantissem a permanência do candidato derrotado na Presidência da República.
Em novembro de 2022, poucas semanas antes da posse de Lula, oficiais com treinamento de forças especiais, chamados de kids pretos, reuniram-se para tentar ganhar apoio da alta cúpula do Exército. Além de pressionar o comando da força armada, o grupo articulou-se para atacar, nas redes virtuais, os oficiais generais que se opunham ao golpe em curso.
Também foram concebidas minutas de atos executivos que formalizassem a quebra da ordem constitucional, que incluíam, entre suas medidas, a prisão do então presidente do STF, ministro Alexandre de Moraes.
Segundo a PGR, o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Azevedo, também se reuniu com os comandantes das três forças, para angariar apoio ao golpe, mas só teria tido a adesão do representante máximo da Marinha, almirante Almir Garnier Santos.
Assassinatos
Não bastassem as campanhas de notícias falsas para desacreditar o sistema eleitoral, as afrontas a autoridades judiciais, as difamações contra militares que não apoiavam a insurreição e a articulação para executar o golpe, os membros da organização criminosa também teriam estruturado, dentro do Palácio do Planalto, segundo a PGR, um plano, chamado de Punhal Verde-Amarelo, para assassinar Lula, seu vice, Geraldo Alckmin, e Alexandre de Moraes.
“O plano foi arquitetado e levado ao conhecimento do Presidente da República, que a ele anuiu, ao tempo em que era divulgado relatório em que o Ministério da Defesa se via na contingência de reconhecer a inexistência de detecção de fraude nas eleições”, escreve a PGR, na denúncia apresentada.
Os preparativos para os assassinatos foram completados e só não foram levados à cabo, no dia 15 de dezembro, porque não conseguiram cooptar, na última hora, o então comandante do Exército.
A denúncia do Ministério Público descreve que, depois de todos esses passos malfadados, a “frustração dominou os integrantes da organização criminosa”. Mas, mesmo assim, não desistiram dos planos de manter Bolsonaro no poder.
Manifestações contra o novo presidente da República, Lula, já empossado, marcadas para 8 de janeiro em Brasília, tornaram-se a grande esperança de concretizar o golpe.
“A organização incentivou a mobilização do grupo de pessoas em frente ao Quartel General do Exército em Brasília, que pedia a intervenção militar na política. Os participantes daquela jornada desceram toda a avenida que liga o Setor Militar Urbano ao Congresso Nacional, acompanhados e escoltados por policiais militares do Distrito Federal”, afirma a denúncia.
As manifestações de 8 de janeiro ficaram marcadas por invasões e vandalismo às sedes dos Três Poderes e têm sido encaradas, em diversos processos penais, pelo STF, como tentativa de golpe de Estado.
De acordo com a PGR, o golpe, que vinha sendo alinhavado e posto em curso desde meados de 2021, só não foi concretizado porque o comandante do Exército e comandantes regionais da Força Armada decidiram não aderir e, portanto, se manter em seu papel constitucional.
8 de janeiro
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Lula vinha sendo apontado como principal adversário do então presidente Jair Bolsonaro na eleição presidencial do ano seguinte e pesquisas eleitorais mostravam o petista à frente.
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Ainda em março, poucos dias depois de Lula ter recuperado sua elegibilidade, o grupo de apoio a Bolsonaro, que viria a se tornar o núcleo da organização criminosa acusada de crimes contra as instituições democráticas pela PGR, passou a cogitar de o então presidente da República passar a afrontar e a desobedecer a decisões do STF.
Nas semanas seguintes, o grupo passaria a defender a ideia de deslegitimar o processo eleitoral brasileiro e a possível vitória do adversário de Bolsonaro. “O grupo registrou a ideia de ‘estabelecer um discurso sobre urnas eletrônicas e votações’ e de replicar essa narrativa ‘novamente e constantemente’, a fim de deslegitimar possível resultado eleitoral que lhe fosse desfavorável e propiciar condições indutoras da deposição do governo eleito”, destaca a denúncia.
Críticas às urnas
O plano de insurreição demorou cerca de três meses para ser colocado em prática. No dia 29 de julho daquele ano, Jair Bolsonaro fez uma transmissão ao vivo, pela internet, das dependências do Palácio do Planalto, em que criticava o sistema eletrônico de votação e exaltava a atuação das Forças Armadas.
A partir desse momento, segundo a PGR, Bolsonaro passaria a fazer pronunciamentos públicos cada vez mais agressivos, com ataques diretos aos poderes constituídos, com o objetivo de causar indignação e revolta em seus apoiadores. O objetivo final, segundo a denúncia, seria tornar aceitável e esperável o recurso à força caso Lula vencesse as eleições de 2022.
Mesmo com a decisão da Câmara dos Deputados, de manter as sistemáticas de votação digital e de apuração dos votos, em sessão no dia 10 de agosto, Bolsonaro insistiu nos ataques ao sistema eleitoral.
Durante os festejos de 7 de Setembro de 2021, Bolsonaro fez um discurso, em São Paulo, no qual “deu a conhecer seu propósito de não mais se submeter às deliberações provenientes da Suprema Corte, confiado no apoio que teria das Forças Armadas”. A essa altura, segundo a PGR, o grupo ao redor do então presidente já tinha traçado uma estratégia que incluía um plano de fuga de Bolsonaro, caso lhe faltasse apoio para o golpe de Estado.
“[Quero] dizer àqueles que querem me tornar inelegível em Brasília: só Deus me tira de lá. E aqueles que pensam que, com uma caneta, podem me tirar da presidência, digo uma coisa, para todos nós. Temos três alternativas, em especial para mim: preso, morto ou com vitória. [Quero] dizer aos canalhas que eu nunca serei preso”, disse Bolsonaro em seu discurso, na ocasião.
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Em 5 julho de 2022, com Lula como favorito à disputa presidencial, Bolsonaro teria convocado uma reunião ministerial para incitar ataques às urnas e a difusão de notícias falsas contra seu adversário. No encontro com os ministros, segundo a denúncia do Ministério Público, “falou-se inequivocamente em ‘uso da força’ como alternativa a ser implementada, se necessário”.
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Com a vitória de Lula, as críticas ao sistema eleitoral persistiram, mesmo depois de relatório de fiscalização das urnas, feito pelo Ministério da Defesa, assegurar que nenhuma falha foi encontrada no sistema de urnas eletrônicas.
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Em novembro de 2022, poucas semanas antes da posse de Lula, oficiais com treinamento de forças especiais, chamados de kids pretos, reuniram-se para tentar ganhar apoio da alta cúpula do Exército. Além de pressionar o comando da força armada, o grupo articulou-se para atacar, nas redes virtuais, os oficiais generais que se opunham ao golpe em curso.
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Segundo a PGR, o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Azevedo, também se reuniu com os comandantes das três forças, para angariar apoio ao golpe, mas só teria tido a adesão do representante máximo da Marinha, almirante Almir Garnier Santos.
Assassinatos
Não bastassem as campanhas de notícias falsas para desacreditar o sistema eleitoral, as afrontas a autoridades judiciais, as difamações contra militares que não apoiavam a insurreição e a articulação para executar o golpe, os membros da organização criminosa também teriam estruturado, dentro do Palácio do Planalto, segundo a PGR, um plano, chamado de Punhal Verde-Amarelo, para assassinar Lula, seu vice, Geraldo Alckmin, e Alexandre de Moraes.
“O plano foi arquitetado e levado ao conhecimento do Presidente da República, que a ele anuiu, ao tempo em que era divulgado relatório em que o Ministério da Defesa se via na contingência de reconhecer a inexistência de detecção de fraude nas eleições”, escreve a PGR, na denúncia apresentada.
Os preparativos para os assassinatos foram completados e só não foram levados à cabo, no dia 15 de dezembro, porque não conseguiram cooptar, na última hora, o então comandante do Exército, segundo a PGR.
A denúncia do Ministério Público descreve que, depois de todos esses passos malfadados, a “frustração dominou os integrantes da organização criminosa”. Mas mesmo assim não desistiram dos planos de manter Bolsonaro no poder.
Manifestações contra o novo presidente da República, Lula, já empossado, marcadas para 8 de janeiro em Brasília, tornaram-se a grande esperança de concretizar o golpe.
“A organização incentivou a mobilização do grupo de pessoas em frente ao Quartel General do Exército em Brasília, que pedia a intervenção militar na política. Os participantes daquela jornada desceram toda a avenida que liga o setor militar urbano ao Congresso Nacional, acompanhados e escoltados por policiais militares do Distrito Federal”, afirma a denúncia.
As manifestações de 8 de janeiro ficaram marcadas por invasões e vandalismo às sedes dos Três Poderes e têm sido encaradas, em diversos processos penais, pelo STF, como tentativa de golpe de estado.
De acordo com a PGR, o golpe, que vinha sendo alinhavado e posto em curso desde meados de 2021, só não foi concretizado porque o comandante do Exército e comandantes regionais da força armada decidiram não aderir e, portanto, se manter em seu papel constitucional.




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