O pacote de corte de gastos que limita o aumento real do salário mínimo, reduz gradualmente os beneficiários do abono salarial e cria restrições para acesso ao Bolsa Família e ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) segue na pauta da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (4). Colocada como prioridade para o Congresso e o Executivo, a urgência para votação do pacote não foi votada na noite dessa terça-feira (3).
O atraso ocorre ao mesmo tempo em que o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, por unanimidade, as regras para a liberação das emendas parlamentares com critérios não previstos na lei sobre o tema aprovada no Parlamento.
Por liminar expedida em agosto deste ano, o ministro do STF Flávio Dino suspendeu o pagamento dos recursos usados pelos parlamentares para demandas em suas bases eleitorais. Ele alegou falta de transparência e rastreabilidade dos recursos.
Após o julgamento ontem (3) que autorizou a liberação das emendas, a Advocacia-Geral da União (AGU) pediu a revisão dos trechos que tratam da aprovação de um plano de trabalho para liberação das emendas, da identificação nominal dos parlamentares solicitantes e do que trata do crescimento do volume total de emendas para 2025.
O AGU sustenta que a lei aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva corrigiu os problemas apontados pelo STF. “O que estamos fazendo, portanto, é apenas buscar um melhor entendimento sobre três pontos específicos da decisão que, em nossa compreensão, já estão contemplados na norma e refletem aquilo que foi pactuado entre o Governo Federal e o Congresso sobre a matéria”, afirmou o advogado-geral da União, Jorge Messias.
O advogado-geral da União, Jorge Messias. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil – Marcelo Camargo/Agência Brasil
Em um desses pontos, o que trata das chamadas emendas pix (transferências especiais), a AGU assegura que a lei atribuiu ao estado ou município beneficiado pelo dinheiro a competência para aprovação do plano de trabalho, e não ao ministério setorial que libera o recurso, conforme definiu o STF.
Críticas
Na sessão plenária dessa terça-feira, parlamentares criticaram as regras definidas pelo STF para transparência e rastreabilidade das emendas. O deputado Alceu Moreira (MDB-RS) lamentou que “agora, até para aplicar a emenda orçamentária, tem que pedir licença para o Dino. Se ele deixar, é sim. Quer dizer, eu virei deputado de meia colher”.
Já o deputado Gustavo Gayer (PL-GO) destacou que o Congresso está preocupado em como conseguir de volta as emendas. “É a única coisa de que se fala aqui: como vamos pegar de volta as emendas que o Flávio Dino, amigo do Lula, impediu lá no STF”, disse.
Nesta terça-feira (20), o Supremo reuniu os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para resolver o impasse provocado pelas decisões de Dino, que suspenderam o pagamento das emendas até o cumprimento de critérios de rastreabilidade e transparência dos recursos.
Pelo acordo, a Câmara e o Senado terão 10 dias para regulamentar o repasse das emendas. Em seguida, será aberto prazo para manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Advocacia-Geral da União (AGU).
Segundo Flávio Dino, após o cumprimento das condicionantes pelo Congresso, o plenário da Corte deverá proferir uma decisão definitiva sobre o caso.
“Vai haver uma outra decisão consolidando mais ou menos o que nós temos, depois de visto pela AGU e PGR. A tendência é levar para o plenário para julgamento definitivo. Acho que tem boas balizas, bons trilhos que melhoram o sistema”, avaliou.
O ministro disse acreditar que as regras serão cumpridas pelo Congresso. Pelo acordo, as “emendas Pix” deverão ser destinadas prioritariamente para obras inacabadas, e as impositivas de bancadas serão encaminhadas para projetos estruturantes dos estados.
“O documento não tem essa força normativa. Mas claro que todo mundo vai cumprir. O acordo não finaliza os processos, tanto que as liminares estão valendo. O acordo sinaliza o caminho pelo qual nós vamos chegar ao fim do processo”, disse.
Emendas impositivas
Na quarta-feira (14), o ministro Flávio Dino decidiu que os repasses das emendas impositivas deverão ficar suspensos até que os poderes Legislativo e Executivo criem medidas de transparência e rastreabilidade das verbas. Esse tipo de emenda obriga o governo federal a enviar os recursos previstos para órgãos indicados pelos parlamentares.
A decisão foi motivada por uma ação protocolada na Corte pelo PSOL. O partido alegou ao Supremo que o modelo de emendas impositivas individuais e de bancada de deputados federais e senadores torna “impossível” o controle preventivo dos gastos.
O ministro entendeu que a suspensão das emendas era necessária para evitar danos irreparáveis aos cofres públicos. Pela decisão, somente emendas destinadas para obras que estão em andamento e para atendimento de situação de calamidade pública poderão ser pagas.
O ministro entendeu que esse tipo de emenda deve seguir critérios de transparência e de rastreabilidade. Pela mesma decisão, a Controladoria-Geral da União (CGU) deverá realizar uma auditoria nos repasses no prazo de 90 dias.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), criticou nesta terça-feira (30) a judicialização, por parte do governo, de trechos da Lei 14.784, de 2023, que prorroga a desoneração da folha de pagamento de empresas e prefeituras até 2027. Segundo ele, o ajuizamento da ação no Supremo Tribunal Federal (STF) foi um erro primário do governo federal e gera uma crise de confiança na relação entre os Poderes.
“É inegável o direito que se tem de acessar a Justiça, é direito do cidadão e também de um poder. A questão que nós ponderamos apenas é que em um tema que está sendo discutido no ambiente da política, entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo, estamos no meio dessa discussão política, haver a precipitação do ajuizamento de uma ação. Esse ponto atribuímos ser um erro do governo federal sob todos os aspectos”, disse Pacheco, em entrevista coletiva.
Em entrevista nessa segunda-feira (29), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a manutenção da desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia e da desoneração para pequenos municípios traz o risco de uma nova reforma da Previdência em três anos.
Salários
Pacheco voltou a condicionar a votação da PEC do Quinquênio, que cria adicional sobre o salário de carreiras jurídicas, ao projeto que acaba com os supersalários no serviço público. Segundo ele, a economia para as contas públicas que seria gerada com o projeto de lei que combate os supersalários é superior ao incremento de gasto, dentro do Orçamento, para o pagamento do quinquênio, um bônus de 5% do salário a cada cinco anos a carreiras do Judiciário.
“As duas coisas casadas e em conjunto significam economia para o Estado brasileiro. Essa combinação do projeto de lei com a emenda não altera em nada nossa busca do cumprimento da meta fiscal”, disse.